justificação do valor científico
O trajecto mostra uma sucessão de ocorrências geológicas relacionadas com a distensão mesozóica, com a inversão da Bacia Lusitaniana e, principalmente, com a instalação do Complexo Ígneo de Sintra. De Sul para Norte, atravessando unidades deste o Cretácico Inferior até o Jurássico Superior, descrevem-se de seguida alguns desses aspectos:
1 – Aflora na praia do Abano um dos principais desligamentos (NNW-SSE) com exposição do espelho de falha com uma área considerável, que poderá ter uma história geológica complexa a saber: a) falha normal associada à evolução da Bacia Lusitaniana, b) reactivação durante a instalação do Complexo e, novamente, c) reactivação como desligamento direito durante a inversão tectónica cenozóica. Constitui uma das raras ocorrências, notórias, que afecta a cobertura sedimentar mesozóica, que materializará um lineamento profundo e extenso (mais de 200 km) que liga os principais complexos ígneos mesozóicos que afloram na parte emersa da Margem Ocidental Ibérica (Sintra, Sines e Monchique).
2 – Observa-se afloramento (com grande área e qualidade de exposição) com múltiplos filões, de composições (máficos e félsicos), géneses e geometrias diferentes (complexo radial e sistema de cone sheets ), mostrando relações de corte: conclui-se que os filões radiais são mais recentes.
3 – Afectando unidades hemipelágicas do Jurássico Superior, encontra-se uma falha normal sin-sedimentar rodada pelo basculaneto geral das unidades pela instalação do Complexo Ígneo.
4 – À medida que nos aproximamos do limite do Complexo, uma unidade (“Xistos do Ramalhão”) formada por pelitos negros finamente interestratificados com leitos carbonatados, apresenta um sistema pervasivo de veios metassomáticos. São perpendicular à estratificação e representam a injecção de fluidos hidrotermais silicatados aquando da intrusão e do consequente estiramento das camadas da cobertura.
5 – Próximo do contacto (na Ponta da Abelheira) observa-se soleira básica mostrando estrutura em book shelf extensional relacionado com a rotação dos estratos aquando da instalação do complexo ígneo, assim como falhas normais nos sedimentos, também rodadas.
A qualidade do acesso é variável, vai aumentando de dificuldade à medida que nos deslocamos ao longo do corte. Possibilidade de “cruzamento” com as frameworks “Registo jurássico na Bacia Lusitaniana” e “As arribas (actuais e fósseis) do litoral português”.
Outros valores e sua justificação
A variedade de formas e cores, a imponência das arribas, a proximidade a serra e o oceano, o contacto com uma flora muito particular e, no último ponto, os ecossistemas associados a litorais rochosos conferem ao geossítio (corte com cerca de 1100 m) um valor paisagístico excepcional, talvez dos mais belos de todo o País.
Valor educativo excepcional. São observáveis não apenas as ocorrências atrás enumeradas (ainda que de forma incompleta) relacionadas directamente com a framework, mas muitos outros podem ser explorados, nomeadamente nas seguintes áreas: Estratigrafia (é dos raros pontos do País onde se pode ver em continuidade o limite Jurássico-Cretácico), Paleontologia e paleoecologia (há bastantes grupos de fósseis, particularmente de corais, polipeiros e estromatólitos típicos de taludes recifais, Geologia do Quaternário (plataforma de abrasão marinha) dinâmica e morfologia litoral (“livrarias”, praias de areia e de seixos, bem como uma série de outras formas).
Valor cultural elevado. Sobranceiro à praia do Abano encontra-se um antigo forte, parcialmente em ruínas, Classificado como Imóvel de Interesse Público em 1977, trata-se do Forte do Guincho/Forte das Velas e constitui um exemplo da arquitectura militar do século XVII. Foi erguido no Reinado de D. João IV, como fortaleza de defesa da costa e servia, sobretudo, para vigia do mar, cruzando fogos com a Bateria da Galé. A sua planta é rectangular, com a bateria voltada para o mar e a casa forte, de menores dimensões, virada a terra. Abandonado há décadas será recuperado pela Autarquia de Cascais, para ali se instalar um Centro Interpretativo de apoio às actividades turístico-ambientais, promovidas pelo Parque Natural Sintra-Cascais (toda a framework encontra-se na área do Parque).